O texto da matéria, a seguir, é de autoria do artista Ferreirinha, enviado ao blog por e-mail, que solicitou publicação.
Dia 15 de março (terça-feira), 05h30min, de Massapê com destino a Fortaleza, o passageiro da poltrona última (a de número 45), viajava em uma das rodonaves mais modernas da Guanabara - empresa que detém o monopólio de transporte de passageiros em quase todo o estado do Ceará, sem concorrência nas linhas que opera. Após uma rápida parada em Irauçuba, de repente o que se vê a bordo são tripulantes se abanando. Crianças quase que totalmente despidas em movimentos rotineiros indo e voltando do banheiro literalmente molhadas (do suor e da água). Eu vi idosos com problemas de pressão alta passarem mal. Vi passageiros completamente molhados reclamarem e indagarem entre si o que estaria acontecendo. Após algum tempo, cerca de meia hora, princípio de pânico generalizado, o cobrador tomou a iniciativa de abrir as seis espécies de quebra-vento localizadas nas laterais do ônibus, que de vento nada quebrava, entretanto, fazia circular um pouco de ar dentro daquele tubo de vidro e metal. Não fosse São Pedro com sua generosa contribuição de proporcionar um clima ameno, com raríssimas aparições do sol, o nível do estado de insalubridade teria sido bem pior, quiçá, insuportável à tolerância humana. Enfim chegamos em Itapajé. O motorista nos informou que iria comunicar o incidente a empresa, e caso solucionasse o problema de refrigeração de ar, o coletivo seguiria adiante; caso não, todos os passageiros teriam que fazer baldeação aguardando a vinda de outro ônibus. A maioria dos passageiros, esperançosos, tratou de se reidratar, comprando bastante líquido. Ao final do tempo de quinze minutos de espera, o motorista simplesmente deu umas buzinadas, e todos, um a um, adentraram ao ônibus, que seguiu viajem, novamente atormentando os incautos passageiros em face daquele insuportável calor, se não bastassem as freadas bruscas e solavancos do dirigível tendo em vista as enormes crateras lunares da BR 222. Enquanto isso, o passageiro ao fundo, aquele da poltrona 45, se sentia além de vítima, uma testemunha ocular dada à visão privilegiada, registrando as inquietações dos demais agonizantes – cidadãos que desconheciam os seus direitos. Mais adiante, precisamente em São Gonçalo do Amarante, um bendito passageiro desceu do ônibus, e como que guiado por Deus, outro passageiro que tinha formação de técnico-profissional eletricista se ofereceu para ajudar, ocasião que ao abrir a porta de acesso ao motor, logo notou a desconexão de um simples fio, o suficiente para restabelecer o serviço de ar condicionado. Confesso que até então senti-me na pele de uma sardinha enlatada, daí o sugestivo título da crônica.
Autor: o passageiro do inferno, Ferreirinha.
Massapê, 18 de março de 2011.
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