24/02 - Mulheres se organizam em redes de
apoio para ajudar umas às outras, combater a violência e o preconceito e
conseguir mais respeito e oportunidades,em um vigoroso movimento que envolve
famosas e anônimas e tem gerado mudanças cruciais na sociedade.
Nunca
fomos tão fortes. No último ano, mulheres denunciaram publicamente homens
poderosos em casos de assédios. Organizaram manifestações em diferentes países
contra o feminicídio e pela manutenção e ampliação de direitos. Criaram redes
de apoio para ajudar vítimas de violência doméstica, de agressões e de
estupros.
Desenvolveram
grupos de debate e de apoio mútuo nas redes sociais. Discutiram e condenaram o
machismo, o racismo e a homofobia e trouxeram força para a nova onda de um
movimento que tem mudado mentalidades, comportamentos e relações.
Diante
de tamanha mobilização, “feminismo” foi escolhida a palavra de 2017 pelo
dicionário americano Merriam-Webster e a busca pelo termo no Google cresceu
200% desde 2016.
“Estamos
em um momento em que o feminismo se tornou a grande força de enfrentamento não
só do machismo, mas que leva adiante a luta anti-racista e pelos direitos das
mais diversas minorias políticas”, afirma a filósofa Marcia Tiburi, autora do
recém-lançado “Feminismo em Comum” (Rosa dos Tempos).
Entre
os marcos do feminismo atual estão as redes de solidariedade desenvolvidas por
mulheres. A maioria de apoio para vítimas de violência. “São alternativas
criadas já que as instituições tradicionais não são responsáveis o suficiente”,
afirma Tiburi. As conexões se dão, em grande parte, pelas redes sociais. O
Fórum Nacional de Políticas Públicas para Mulheres é um dos grupos de
referência, começou como uma página no Facebook e depois migrou para o Whatsapp
e hoje inclui pessoas de todo o País.
“A
ideia inicial era trocar informações sobre cursos e artigos e reunir contatos”,
afirma Ana Victoriano, dona da iniciativa. “Mas hoje se tornou uma comunidade
de ajuda a vítimas de agressões. Não imaginei que tomaria essa proporção.” Os
pedidos de ajuda chegam diariamente e, por meio da rede, os contatos são feitos
para que as mulheres possam receber orientação adequada. Depois de passar meses
apanhando do marido, a advogada Maíra Moura Soares Neves, 41 anos, procurou Ana
em outubro de 2017 e conseguiu deixar o casamento em que era agredida constantemente
e do qual se via refém.
“Em
qualquer conversa, ouvia gritos de vagabunda ou recebia tapas”, diz. Moradora
da cidade de Barra do Bugres, a 180km de Cuiabá (MT), era casada com um
delegado e não tinha como denunciá-lo em uma delegacia. “Com certeza iam
engavetar meu caso.” Maíra então usou o Facebook para pedir ajuda a Ana, que
acionou conhecidas em São Paulo. Elas falaram com juristas no Mato Grosso que
indicaram uma promotora em uma cidade próxima a dela.
“Criaram
uma corrente de ajuda”, diz. Em pouco tempo, uma denúncia foi feita contra
o ex-marido de Maíra e ela se separou. A mesma promotora foi quem a ajudou a
retirar seus pertences da antiga casa. Ao contar sua história, Maíra chora,
respira fundo e conclui: “Eu estava de mãos atadas, mas essa rede de mulheres
me salvou.”
Feminismos
O
feminismo brasileiro tem características específicas como a necessidade de
pensar as diferentes perspectivas envolvendo gênero e, principalmente, raça,
classe e sexualidade.
É um dos debates mais atuais dentro do movimento. “Ser branca em São Paulo é diferente de ser negra e nordestina”, diz Mafoane Odara, coordenadora de projetos do Instituto Avon. Diretora executiva da Anistia Internacional e fundadora da ONG Criola, Jurema Werneck aponta que o feminismo clássico trata da mulher branca de classe média, mas há outras questões que precisam ser mais debatidas.
“O movimento ainda precisa ver como lidar com a maioria das mulheres, e isso inclui negras, trans, entre outros grupos”, afirma. Ela complementa: “Não digo que as pautas não ressoem, nem estou negligenciando reivindicações, mas é preciso retornar aos princípios do próprio feminismo de igualdade e justiça e ter olhar mais amplo.”
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