Massapê, anos oitenta, pleno domingo de
verão, sol causticante, temperatura de aproximadamente 30º na sombra, 9h da
manhã, Jaime Lira inventou de fazer do seu amigo Caceteiro – um moreno de quase
2m de altura, uma espécie de táxi humano. Subiu nas suas costas (tutum) e,
agarrado ao pescoço do rapaz, passeava de bar em bar. De repente, a dupla
foi abordada em plena rua pelo delegado recém chegado à nossa cidade:
- Eu sou o delegado daqui. Que negocio é esse?
A escravidão já acabou faz tempo. Desça já das costas desse pobre homem!
- Doutor, é o meu táxi. Eu estou pagando
caro e adiantado. Hoje é domingo, bandeira 2 – se justificou Jaime Lira. E o Caceteiro emendou:
- Doutor delegado, minha profissão é
carreteiro. Eu passo o dia inteiro carregando sacos e mais sacos de farinha,
açúcar, cimento, pra no final do dia ganhar uns “trocadinhos”. O passageiro
aqui além de especial é bem magrinho, me paga e me trata muito bem, eu merendo
e descanso em todas as paradas obrigatórias e, em questão de duas, três horinhas
ele está completamente bêbado e eu estou liberado...
- Não senhor. Este trabalho não é digno da
pessoa humana. Final de corrida! Faça o seguinte seu Jaime: compre uma
bicicleta e está resolvido o problema – disse o delegado.
De repente passa o nosso amigo Walter Baixinho montado numa
bicicleta bem velhinha, mas bem velhinha mesmo. Jaime a comprou por vinte
Cruzeiros e ao sentar se deu conta que a “magrela” não tinha garupa.
Imediatamente foi com o seu amigo Caceteiro até a Bici-Clóvis:
- Clóvis eu quero uma garupa novinha pra botar
na minha bicicleta bem velhinha!
- Jaime, eu tenho a simples que custa vinte
Cruzeiros e tenho essa outra de aço inox, toda fornida e reforçada por quarenta
Cruzeiros. Qual você quer?
– disse Clóvis Albuquerque, proprietário do estabelecimento.
- Eu quero a melhor, a mais cara, pois sou eu
que vou sentar nela.
E assim foi feito. Passeando pelas ruas de Massapê,
pedalando numa bicicleta velha, bem velhinha mesmo, o nosso coadjuvante
Caceteiro e, sentado numa garupa nova, novinha em folha, o nosso personagem
principal, Jaime Lira. A primeira parada foi no bar do Pipiu, lá no Alto da Boa
Vista; a segunda, no bar do Zé Romão (na rua Sete); a terceira no bar do Pé de Louro
lá no bairro do Ginásio (atualmente Educador Luiz da Hora Pereira); a quarta no
bar do Zé Canuto (centro) e assim por diante. Ao passarem defronte a Igreja
Matriz, Jaime solicita uma parada para vê o que se passava no interior do
recinto. Estacionam a bicicleta na calçada e os dois, juntos, adentram a
igreja. Celebrava-se naquela ocasião, missa de corpo presente de uma velhinha
que morreu de velhice. Isto mesmo, morreu de velhice. Só se ouvia os
comentários: “ela morreu que nem um passarinho”; “morreu bem velhinha”;
“coitadinha da velhinha”; “morreu que nem um passarinho”. Nesse momento Zé Bode
se aproxima do Jaime e pergunta:
- Parea, do que foi mesmo que essa velhinha
morreu?
- Meu amigo Zé Bode, pelo que eu estou
percebendo, ela morreu foi de uma pedrada de baladeira!
- Como assim? – indagou Zé Bode.
- Eu só escuto o povo
dizer que ela morreu que nem um passarinho...
Pois bem, ao terminar a missa, desceram pelos degraus da
igreja, e de repente rolando degraus abaixo, o Negão do Zé Bureta com os seus
mais de 100 quilos. Jaime desviou e o Caceteiro gritou:
- Jaime, porque tu não segurou o homem?
- Eu não! Pensei que ele estava pagando
promessa!...
E ao saírem, se deram conta que a bicicleta foi roubada.
Imediatamente Jaime dispensou seu motorista particular e, não restando-lhe
outra alternativa, sentou-se nos degraus da igreja e começou a chorar. Chorava
copiosamente, quando descia pelos degraus, o padre, que também era novato e que
acabara de celebrar missa de corpo presente daquela velhinha. E vendo o rapaz
aos prantos, logo tratou de consolá-lo:
- Tente se conformar, meu filho. A vida é um
dom de Deus. Ela já estava bem velhinha...
- Mas a garupa era nova, seu padre! – respondeu, desconsolado, Jaime Lira.
Do livro: As Anedotas do Jaime Lira – O Parea. Autor:
Ferreirinha de Massapê.