ADEUS, CHITÃO DOS POBRES
Com a morte do meu
saudoso e querido pai Expedito Ferreira (*22.12.1922 +01.07.2008) – o fundador
do Chitão dos Pobres de Massapê (1948), de grata herança recebi o seu maior
legado, qual seja, a continuidade do Chitão dos Pobres, preservando a nossa
cultura popular regional, pois, esse evento há 63 anos estava inserido no
calendário festivo anual da nossa cidade. Nas três últimas edições, 2009, 2010
(287 pagantes) e 2011 (210 pagantes) o Chitão dos Pobres foi fracasso de
público, de modo que, os prejuízos financeiros foram se acumulando, ao ponto de
não mais suportar a responsabilidade dos compromissos firmados. É bem verdade
que ao longo de sua existência sempre tivemos ajuda de colaboradores firmando
parcerias com pessoas física e jurídica, que foram tantos. Entretanto, essa
ajuda não foi de forma mais substancial e contundente. Por outro lado, o
público cativo – que foi a maior razão da existência e sucesso do Chitão dos
Pobres, não compareceu em peso como nas outroras edições. A exemplo do carnaval
de salão que nas últimas três décadas passou por um processo de transformação,
sendo paulatinamente substituído pelo carnaval de rua, semelhante processo está
ocorrendo nessa última década com o chitão de salão, sendo substituído pelo
chitão de rua, com até três noites de festa animada por grandes bandas e
montada toda uma infra-estrutura com palco, iluminação, segurança, cidade
cenográfica, etc., tudo de forma gratuita.
O Chitão do Centro Social Massapeense (78 anos de tradição), bem como, o
Chitão dos Pobres de Massapê (63 anos de tradição), infelizmente estão com os
seus dias contados. Prova é, o fracasso de público dessas duas tradicionais
festas nas suas recentes edições. Pagamos, ainda, um preço caro pelo fato de no
repertório do Chitão dos Pobres não tocar essa variação moderna do forró – o
forró eletrônico, na maioria das vezes fazendo apologia ao sexo banalizado, as
drogas e um afronta com total desrespeito a mulher, ferindo à moral e aos bons
costumes da nossa sociedade. “Chupa que é
de uva”, “senta que é de menta”, “relaxa que é de borracha” e “não vou não, não quero não, minha mulher
não deixa não”, nunca fizeram parte do nosso repertório, que sempre foi
recheado de baião, xaxado, xote e o forró pé-de-serra. Não pretendo nesse ato,
apresentar justificativas ainda que plausíveis para o fim dessa tradicional
festa. Pelo contrário, só tenho a agradecer a Nação Forrozeira Massapeense e
além fronteiras (dançarinos e parceiros) que sempre nos prestigiaram e estiveram
conosco até o fim. Somos todos sabedores de uma louvável e merecida parceria
firmada esse ano com o Governo Estadual do Ceará dispondo liberação de verba
através da lei de incentivo à cultura, para custear duas bandas que não se
apresentam por menos de vinte mil Reais, destinada ao Chitão do Centro Social
Massapeense, conquanto, seu interlocutor liberou apenas e tão somente a ínfima
importância de quinhentos Reais para o Chitão dos Pobres. Da nossa parte, somos
grato e nosso muitíssimo obrigado. Mas alguém me disse: - “Ferreirinha, são dois pesos e duas medidas”. Como na melodia “Me
Gioconda” em que a protagonista anteveu a triste partida do seu amado para
servir patrioticamente ao seu país na segunda grande guerra mundial, numa
jogada e estratégia de marketing, como que antevendo o fim do Chitão dos
Pobres, tive a idéia de plagiar o radialista Robério Mendes Carneiro, o qual
apresenta o programa “Tudo a vê com você” na Marques Liberal FM de Massapê, com
sucesso absoluto de audiência. E como toda sexta-feira é início de balada ele
assim a descreve com a dramatização que sempre lhe foi peculiar: - “Hoje é sexta-feira! É dia de afogar o ganso
até o tronco, sem dó e sem piedade! Mas isso é pra quem tem! Pra quem não tem,
é passar a mão em cima e dizer de viva voz: eu já fui pai dégua nisso. Mas meus
amigos, a idade é irreversível. Não deixe cair o bico do seu ganso” Pois
bem. O plágio, inclusive com sua própria voz, feito para veiculação na Marques
FM e nos carros de som, consistiu da seguinte forma: - “Hoje é sábado! É dia de Chitão dos Pobres! No Clube dos Operários, com
Tchesco Oliveira e Negão do Norte! São 63 anos de tradição, com valiosos
prêmios pra você! Um computador, uma bicicleta e uma TV! Mas isso é pra quem
vai! Pra quem não vai, é dar a volta por cima e dizer de viva voz: no próximo
ano eu vou! Mas meus amigos, esse é o último suspiro! Vingou, vingou! Se não
vingar, adeus! Não deixe essa peteca cair ”. O comercial apelativo não
funcionou. É... O Chitão dos Pobres ficou só no papel e também por enquanto na
internet. O primeiro, a Associação para Desenvolvimento Cultural de Massapê
Expedito Galinha D’água, nome fantasia Associação Chitão dos Pobres, CNPJ nº
12.833.573/0001-85, presidente Raimundo Ferreira Sousa – Fereirinha, e o
segundo, www.chitaodospobres.com.br. Que pena. Os
gestores públicos (municipal e estadual) deveriam abraçar com mais
comprometimento essa instituição viva, que ao longo da sua história sofreu as
intempéries da vida, pois, seu embrião germinou no final da década quarenta do
século XX - uma época em que vivíamos uma sociedade preconceituosa e racista,
resquícios do Brasil Império, com a abolição da escravatura, onde “pobres e
negros” não tinham acesso às dependências do chitão do Centro Social
Massapeense – um clube destinado a um seleto grupo de sócios (ricos e
brancos). E meu pai, imbuído de um
sentimento de justiça social, concluiu: ora, se existe o Chitão dos Ricos,
porque haveria de existir o Chitão dos Pobres? É essa a origem do nome “Chitão
dos Pobres”. Com sacrifício fiz a minha parte, sem medir esforços, para manter
viva parte da história de Massapê. Despeço-me de cabeça erguida e com a
consciência do dever cumprido, apesar da triste e dolorosa decisão. E eis que
um ombro amigo disse-me baixinho no meu ouvido: - “Ferreirinha, no mundo nada
se acaba; tudo se transforma”. E respirando fundo eu fiquei a matutar com os
meus botões...
O forrozeiro órfão,
Ferreirinha, 30 de julho de 2011.
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