07/03 - O PCC está incomodado. De seu alto escalão até o
baixo clero, membros da maior facção criminosa do Brasil demonstram apreensão e
desconforto com medidas tomadas até agora pelos governos de Jair Bolsonaro, na
Presidência, e de João Doria, no estado de São Paulo. É o que transparece, por
exemplo, uma conversa, à qual a REVISTA ÉPOCA teve acesso com exclusividade, em
que dois representantes do baixo-clero da facção dialogam:
A: —
Alerta rua e sistema.
C: —
Bagulho tá louco né velhinho.
A: —
Caras tão querendo tirar nós xará, tá de brincadeira (...) vai dá guerra.
C: —
Vai dá guerra, vai se f....
A: —
Quero vê bagaço secar, tô louco pra regaçar tudo.
C: —
Nós vamos tá lutando daqui e parceiro daí.
Essa é uma das poucas provas materiais que mostram
a visão da facção paulista — com presença em vários estados brasileiros e
também no Paraguai, na Bolívia, no Peru e na Colômbia — sobre os próximos
quatro anos de governo. Foi gravada durante uma investigação da Polícia Civil
de São Paulo. Não partiu da cúpula da facção, a última instância de decisão.
Entretanto, é um sinalizador concreto de como ela
recebeu a vitória de um governo que, ao longo da campanha eleitoral, prometeu
fechar o cerco contra bandidos que traficam armas e drogas.
Durante dois meses, ÉPOCA conversou com
representantes dos setores de Inteligência dos órgãos que investigam o crime
organizado em São Paulo. Também ouviu um interlocutor direto do chefe da
facção, Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola. Num discurso uníssono, todos
dizem que o crime organizado está assustado com a possível repressão alardeada
pelo novo governo. Com base em relatos de informantes, um delegado do mais alto
escalão do governo paulista resumiu o espírito: “Estão com medo e sem saber
como reagir.
Quem está na cadeia está preocupado com a perda de
benefícios. Quem está fora, com a repressão: se vai perder biqueiras ou se vai
morrer”, afirmou.
Na manhã da quarta-feira 13, a facção sofreu seu maior revés recente. Passados só 44 dias do início do governo Bolsonaro, 22 integrantes foram transferidos para presídios federais em Brasília, Distrito Federal, em Mossoró, Rio Grande do Norte, e em Porto Velho, Rondônia. Foi a Justiça paulista quem determinou as transferências, mas elas só foram possíveis porque, pela primeira vez, houve ambiente político para fazê-las. Durante as mais de três décadas em que Marcola ficou preso em São Paulo, o governo nunca teve a intenção de mandá-lo para fora do estado. A gestão do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) foi, inclusive, acusada de ter feito um acordo com a facção. Em troca de garantir a paz nos presídios e nas ruas — e assim controlar as ações dos criminosos —, assegurava sua permanência no estado, em presídios já conhecidos dos chefes e com certas facilidades não disponíveis nas unidades federais.
Na tentativa de evitar possíveis retaliações, o governo federal autorizou a presença das Forças Armadas para fazer a segurança no entorno dos presídios em Mossoró e Porto Velho.
Em nota, o Ministério da Justiça informou que essa operação é a primeira ação realizada com a participação da Secretaria de Operações Integradas e que o “isolamento de lideranças é estratégia necessária para o enfrentamento e o desmantelamento de organizações criminosas”. Em entrevista coletiva, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou que “o estado (de São Paulo) não será refém do crime, o crime será refém do estado”. Segundo o relato de um funcionário que acompanhou Marcola até o aeroporto em Presidente Prudente, o chefe da organização criminosa estava irritadíssimo - estado de espírito que não condiz com seu perfil, descrito como poliido e sereno. Chegou até a esbravejar, lançando alguns palavrões.
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