Ao
não ter afastado ministros denunciados, em setembro, e ao garantir o foro
privilegiado de amigos encrencados com a Lava Jato, Michel Temer segue se
queimando moralmente.
A edição de sexta-feira do Diário
Oficial da União publicou
o texto da Lei 13.502, que reorganiza o primeiro escalão do Poder Executivo
nacional e é resultado de uma medida provisória publicada em maio deste ano.
Pelo menos um ministério que tinha sido extinto no enxugamento realizado por
Michel Temer quando assumiu a Presidência, o dos Direitos Humanos (atualmente
no noticiário graças às reivindicações salariais da titular da pasta, Luislinda
Valois), foi ressuscitado. Mas significativo mesmo é o fato de a
Secretaria-Geral da Presidência da República ganhar status de ministério, com
consequências muito bem-vindas – leia-se foro privilegiado – para Moreira
Franco, que ocupa o cargo.
O peemedebista, na verdade, já estava em situação confortável desde
fevereiro, quando foi publicada uma outra medida provisória de reorganização do
Executivo. Dilma Rousseff tinha acabado com a Secretaria-Geral em 2015, mas
Temer recriou o posto para acomodar o até então secretário-executivo do
Programa de Parcerias de Investimentos. Ocorre que, como secretário, Moreira
Franco não tinha foro privilegiado, e estava na mira da Operação Lava Jato,
tendo sido citado em delações premiadas a cujo conteúdo a imprensa havia tido
acesso. Com uma canetada, Temer tirou o colega das mãos da força-tarefa que
estava prestes a investigá-lo; a partir de então, qualquer denúncia contra
Moreira Franco chegaria à Procuradoria-Geral da República, e um eventual
julgamento caberia ao Supremo Tribunal Federal, em vez do juiz Sergio Moro.
Mas
Moreira Franco só não perdeu o cargo porque Michel Temer descumpriu uma
promessa feita com muita fanfarra no início deste ano. Em fevereiro, poucos
dias depois de ter trazido Moreira Franco para o primeiro escalão do governo,
com foro privilegiado, Temer disse, em pronunciamento: “Se houver denúncia, o
que significa um conjunto de provas eventualmente que possam conduzir a seu
acolhimento, o ministro que estiver denunciado será afastado provisoriamente.
Depois, se acolhida a denúncia e aí, sim, a pessoa, no caso o ministro, se
transforme em réu – estou mencionando os casos da Lava Jato –, o afastamento é
definitivo”.
O
presidente alegava que nem indícios, nem inquéritos, eram motivo para afastar
um ministro; a denúncia seria uma “linha de corte” adequada. Dois meses depois
da promessa de Temer, oito de seus ministros viraram alvo de inquéritos, mas
ainda não havia denúncia nenhuma.
A
denúncia veio, em setembro. Tanto Moreira Franco quanto Eliseu Padilha,
ministro-chefe da Casa Civil, foram denunciados por Rodrigo Janot, então
procurador-geral da República, por organização criminosa ao lado do próprio
presidente Temer. Precisando de bons articuladores políticos para evitar que os
deputados aprovassem o envio da denúncia ao STF, Temer esqueceu a promessa e
manteve ambos no cargo, evitando o assunto dos ministros e limitando-se a
atacar a denúncia de Janot.
Para
sorte de Padilha e Moreira Franco, o presidente da Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) da Câmara rejeitou um pedido para que as denúncias fossem
fatiadas. A controvérsia estava no fato de que, pela Constituição, a Câmara só
é chamada a se pronunciar quando se trata do presidente da República, não
cabendo a ela barrar denúncias contra ministros de Estado. No entanto, a
denúncia oferecida pela PGR era uma peça única que incluía Temer, Padilha e
Moreira Franco. O presidente da CCJ adotou este entendimento e, com o resultado
do plenário que beneficiou Temer no fim de outubro, o arquivamento ajudou
também os dois ministros.
Ao
ter ignorado, em setembro, a própria promessa a respeito do afastamento de
ministros denunciados, e ao consagrar em lei, agora, a reorganização do
Executivo garantindo o foro privilegiado de amigos encrencados com a Lava Jato,
Michel Temer segue se queimando moralmente, esperando que o reaquecimento da
economia o absolva no tribunal da opinião pública.
Gazeta do Povo
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