01.09.2019 - Em testes com ratos, cientistas
norte-americanos identificam que o excesso de peso faz com que respostas
cerebrais a estímulos gustativos tenham menor duração e magnitude. A equipe não
descarta a possibilidade de o fenômeno ocorrer também com humanos.
O excesso de peso pode influenciar
negativamente o paladar. É o que mostra um estudo norte-americano. Cientistas
observaram, em experimento com ratos, alterações neurais que podem estar
relacionadas à falha do reconhecimento do sabor dos alimentos. As descobertas
foram apresentadas recentemente na revista especializada Frontiers in
Integrative Neuroscience.
Já se sabia que a percepção do paladar muda
com a obesidade, mas as alterações neurais subjacentes a esse fenômeno ainda
são mal compreendidas por especialistas da área. “É surpreendente sabermos tão
pouco sobre como o sabor é afetado pela obesidade, já que o gosto da comida é
um grande fator para determinar o que escolhemos comer”, frisa.
Lorenzo e sua equipe realizaram um estudo
observacional para entender melhor essa relação. Os pesquisadores resolveram
focar em uma região relacionada aos estímulos gustativos, chamada núcleo tractus solitarius, uma parte do
cérebro envolvida no processamento do paladar. Eles registraram as respostas
aos estímulos gustativos de células únicas presentes no tronco cerebral de
ratos que se tornaram obesos pela ingestão de uma dieta rica em gordura.
Descobriram que, nesses roedores, as respostas gustativas eram menores em
magnitude e em duração e demoravam mais para se desenvolver, em comparação às
cobaias magras.
Embora os resultados se apliquem apenas a
ratos, os autores do estudo acreditam que o mesmo processo pode se traduzir em
humanos. “Outras investigações mostraram que o número de papilas gustativas na
língua é menor em ratos obesos e também em humanos. Então, é boa a
probabilidade de que a resposta do paladar no cérebro humano também seja menos
sensível”, justifica Di Lorenzo. Atualmente, a cientista e sua equipe estudam
os efeitos da cirurgia bariátrica nas respostas do tronco cerebral, a fim de
verificar se esse procedimento pode recuperar alguns ou todos os deficits no
sistema do paladar.
Para Amauri Araújo Godinho, neurologista do
Hospital Santa Lúcia, em Brasília, e membro da Sociedade Brasileira de
Neurologia (SBN), o estudo mostra dados extremamente interessantes, que
corroboram informações já conhecidas na área médica entre a relação do paladar
com a obesidade. “Temos algumas evidências mais antigas que apontam que o
indivíduo obeso tem menor sensibilidade palatável, principalmente para doces.
Isso poderia ser apontado como um dos motivos dele procurar mais sensação na
comida e, por isso, ingerir um volume maior de alimento. Mas isso ainda não foi
totalmente comprovado”, observa.
Segundo o médico, os dados vistos no trabalho
norte-americano ainda não esclarecem totalmente essa suspeita. Por isso,
merecem mais desdobramentos, defende Godinho. “Essas medições ocorrem em ratos,
pois é difícil de serem feitas em humanos, seria algo mais complicado e
eticamente questionável. Mas o sistema dos roedores é diferente do nosso.
Precisamos investigar isso melhor e com mais cuidado.”
Godinho ressalta que foram pensadas algumas
opções de intervenção com base no sistema neural, mas a medida ainda é
completamente experimental. “Temos estudos que exploram a neurocirurgia
bariátrica, em que eletrodos são postos na área do córtex límbico, que está
relacionada ao prazer e à saciedade, e, ao estimulá-lo, o paciente se sentiria
mais satisfeito, comendo menos” explica. “Porém, essa questão é mais
complicada, porque essa área não está ligada apenas à saciedade, mas também a
outras emoções, o que pode causar desequilíbrios emocionais como efeito
colateral”, detalhou.
Ele também ressalta que fatores emocionais
são de extrema importância na avaliação de candidatos à cirurgia bariátrica.
“Quando selecionamos esses pacientes, temos que ficar atentos à forma como
pensam em relação à comida, temos que avaliar se eles vão conseguir mudar os
hábitos alimentares.
Temos casos de pessoas que não
conseguem, passam a se alimentar muito,
não têm espaço no estômago e começam a vomitar”, conta. “A relação do
comportamento com a obesidade é importante e, por isso, tem sido tão abordada
por especialistas que tentam entender a melhor forma de lidar com ela.”
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