Na
escola, em livros e principalmente na nossa vida cotidiana, não há quem
não ouça uma poesia e fique imune às suas palavras e sentidos. Poemas
traduzem sentimentos profundos no ser humano, há séculos, e por isso têm a
capacidade de alegrar ou entristecer alguém, dependendo do contexto
onde é aplicado.
Então, veja-os com exclusividade aqui no blog Massapê Indo e Voltando, os 10 mais importantes e significativos
poemas de autores brasileiros de todos os tempos, escolhidos por um grupo de professores, críticos, e jornalistas.
Confira a lista, a foto dos autores, clicando no termo continue lendo, sublinhado abaixo. Aproveite bem o conteúdo, e boa leitura!
1) A MÁQUINA DO MUNDO (Carlos Drummond de Andrade)
E como eu palmilhasse vagamente uma estrada de Minas, pedregosa, e no fecho da tarde um sino rouco
se misturasse ao som de meus sapatos que era pausado e seco; e aves pairassem no céu de chumbo, e suas formas pretas lentamente se fossem diluindo na escuridão maior, vinda dos montes e de meu próprio ser desenganado, a máquina do mundo se entreabriu para quem de a romper já se esquivava e só de o ter pensado se carpia. Abriu-se majestosa e circunspecta, sem emitir um som que fosse impuro nem um clarão maior que o tolerável pelas pupilas gastas na inspeção contínua e dolorosa do deserto, e pela mente exausta de mentar toda uma realidade que transcende a própria imagem sua debuxada no rosto do mistério, nos abismos. Abriu-se em calma pura, e convidando quantos sentidos e intuições restavam a quem de os ter usado os já perdera e nem desejaria recobrá-los, se em vão e para sempre repetimos os mesmos sem roteiro tristes périplos, convidando-os a todos, em coorte, a se aplicarem sobre o pasto inédito da natureza mítica das coisas. (Trecho de A Máquina do Mundo, de Carlos Drummond de Andrade)
se misturasse ao som de meus sapatos que era pausado e seco; e aves pairassem no céu de chumbo, e suas formas pretas lentamente se fossem diluindo na escuridão maior, vinda dos montes e de meu próprio ser desenganado, a máquina do mundo se entreabriu para quem de a romper já se esquivava e só de o ter pensado se carpia. Abriu-se majestosa e circunspecta, sem emitir um som que fosse impuro nem um clarão maior que o tolerável pelas pupilas gastas na inspeção contínua e dolorosa do deserto, e pela mente exausta de mentar toda uma realidade que transcende a própria imagem sua debuxada no rosto do mistério, nos abismos. Abriu-se em calma pura, e convidando quantos sentidos e intuições restavam a quem de os ter usado os já perdera e nem desejaria recobrá-los, se em vão e para sempre repetimos os mesmos sem roteiro tristes périplos, convidando-os a todos, em coorte, a se aplicarem sobre o pasto inédito da natureza mítica das coisas. (Trecho de A Máquina do Mundo, de Carlos Drummond de Andrade)
2) VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA (Manuel Bandeira)
Vou-me embora pra Pasárgada Lá sou amigo do rei Lá tenho a mulher que eu quero Na cama que escolherei. Vou-me embora pra Pasárgada Vou-me embora pra Pasárgada, Aqui eu não sou
feliz. Lá a existência é uma aventura, de tal modo inconsequente, Que Joana
a Louca de Espanha Rainha e falsa demente. Vem a ser contraparente, Da
nora que nunca tive. E como farei ginástica? Andarei de bicicleta. Montarei em burro brabo. Subirei no pau-de-sebo. Tomarei banhos de mar! E quando estiver cansado, deito na beira do rio. Mando chamar a mãe-d’água pra me contar as histórias que no tempo de eu menino, Rosa vinha me
contar. Vou-me embora pra Pasárgada. Em Pasárgada tem tudo. É outra civilização. Tem um processo seguro de
impedir a concepção. Tem telefone automático, tem alcaloide à vontade, tem
prostitutas bonitas, para a gente namorar. E quando eu estiver mais triste, mas triste de não ter jeito, quando de
noite me der vontade de me matar — Lá sou amigo do rei — Terei a mulher
que eu quero na cama que escolherei Vou-me embora pra Pasárgada.
3) POEMA SUJO (Ferreira Gullar)
Turvo, turvo à turva mão do sopro contra o muro escuro menos, menos que escuro, menos que mole e duro. menos que fosso e muro: menos que
furo escuro mais que escuro: claro como água? como pluma? claro mais
que claro claro: coisa alguma e tudo (ou quase) um bicho que o universo
fabrica e vem sonhando desde as entranhas azul era o gato azul era o
galo azul o cavalo azul teu cu tua gengiva igual a tua bocetinha que
parecia sorrir entre as folhas de banana entre os cheiros de flor e
bosta de porco aberta como uma boca do corpo (não como a tua boca de
palavras) como uma entrada para eu não sabia tu não sabias fazer girar a
vida com seu montão de estrelas e oceano entrando-nos em ti bela bela
mais que bela mas como era o nome dela? Não era Helena nem Vera nem Nara
nem Gabriela nem Tereza nem Maria Seu nome seu nome era… Perdeu-se na
carne fria perdeu na confusão de tanta noite e tanto dia (Trecho de
Poema Sujo, de Ferreira Gullar).
4) SONETO DE FIDELIDADE (Vinicius de Moraes)
De tudo, ao meu amor serei atento. Antes, e com tal zelo, e sempre, e
tanto. Que mesmo em face do maior encanto dele se encante mais meu
pensamento.Quero vivê-lo em cada vão momento. E em louvor hei de espalhar meu canto. E
rir meu riso e derramar meu pranto. Ao seu pesar ou seu contentamento. E assim, quando mais tarde me procure. Quem sabe a morte, angústia de quem vive. Quem sabe a solidão, fim de quem ama. Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama. Mas que seja infinito enquanto dure.
5) VIA LÁCTEA (Olavo Bilac)
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso!” E eu vos direi,
no entanto, que, para ouvi-las, muita vez desperto. E abro as janelas,
pálido de espanto…
E conversamos toda a noite, enquanto a Via Láctea, como um pálio aberto, cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo céu deserto. Direis agora: “Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido tem o que dizem, quando estão contigo?”
E eu vos direi: “Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido. Capaz de ouvir e de entender estrelas.”
E conversamos toda a noite, enquanto a Via Láctea, como um pálio aberto, cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo céu deserto. Direis agora: “Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido tem o que dizem, quando estão contigo?”
E eu vos direi: “Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido. Capaz de ouvir e de entender estrelas.”
6) O CÃO SEM PLUMAS (João Cabral de Melo Neto)
A cidade é passada pelo rio como uma rua é passada por um cachorro; uma fruta por uma espada. O rio ora lembrava a língua mansa de um cão, ora o ventre triste de um
cão, ora o outro rio de aquoso pano sujo dos olhos de um cão. Aquele rio era como um cão sem plumas. Nada sabia da chuva azul, da
fonte cor-de-rosa, da água do copo de água, da água de cântaro, dos
peixes de água, da brisa na água. Sabia dos caranguejos de lodo e ferrugem. Sabia da lama como de uma mucosa. Devia saber dos povos. Sabia seguramente da mulher febril que habita as ostras. Aquele rio jamais se abre aos peixes, ao brilho, à inquietação de faca que há nos peixes. Jamais se abre em peixes.
7) CANÇÃO DO EXÍLIO (Gonçalves Dias)
Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá; as aves, que aqui gorjeiam, não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, onde canta o Sabiá. Minha terra tem primores, que tais não encontro eu cá; Em cismar — sozinho, à noite — Mais prazer encontro eu lá; minha terra tem palmeiras, onde canta o Sabiá. Não permita Deus que eu morra, Sem que eu volte para lá; Sem que desfrute os primores, que não encontro por cá; sem qu’inda aviste as palmeiras, onde canta o Sabiá.
Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, onde canta o Sabiá. Minha terra tem primores, que tais não encontro eu cá; Em cismar — sozinho, à noite — Mais prazer encontro eu lá; minha terra tem palmeiras, onde canta o Sabiá. Não permita Deus que eu morra, Sem que eu volte para lá; Sem que desfrute os primores, que não encontro por cá; sem qu’inda aviste as palmeiras, onde canta o Sabiá.
8) AS CISMAS DO DESTINO (Augusto dos Anjos)
Recife. Ponte Buarque de Macedo. Eu, indo em direção à casa do Agra, assombrado com a minha sombra magra, pensava no destino, e tinha medo! Na austera abóbada alta o fósforo alvo das estrelas luzia… O calçamento sáxeo, de asfalto rijo, atro e vidrento, copiava a polidez de um crânio
calvo. Lembro-me bem. A ponte era comprida, e a minha sombra enorme enchia a
ponte como uma pele de rinoceronte estendida por toda a minha vida! A noite fecundava o ovo dos vícios animais. Do carvão da treva imensa caía um ar danado de doença sobre a cara geral dos edifícios! Tal uma horda feroz de cães famintos, atravessando uma estação deserta, uivava dentro do eu, com a boca aberta, a matilha espantada dos
instintos! Era como se, na alma da cidade, profundamente lúbrica e revolta, mostrando as carnes, uma besta solta soltasse o berro da animalidade. E, aprofundando o raciocínio obscuro, eu vi, então, à luz de áureos
reflexos. O trabalho genésico dos sexos, fazendo à noite os homens do
Futuro. (Trecho de As Cismas do Destino, de Augusto dos Anjos).
9) AS POMBAS (Raimundo Correia)
Vai-se a primeira pomba despertada… Vai-se outra mais… mais outra… enfim
dezenas de pombas vão-se dos pombais, apenas raia sanguínea e fresca a
madrugada. E à tarde, quando a rígida nortada sopra, aos pombais de novo elas,
serenas, ruflando as asas, sacudindo as penas, voltam todas em bando e
em revoada. Também dos corações onde abotoam, os sonhos, um por um, céleres voam. Como voam as pombas dos pombais; no azul da adolescência as asas soltam, fogem… Mas aos pombais as pombas voltam, E eles aos corações não voltam mais.
10) INVENÇÃO DE ORFEU (Jorge de Lima)
Um barão assinalado sem brasão, sem gume e fama cumpre apenas o seu
fado: amar, louvar sua dama, dia e noite navegar, que é de aquém e de
além-mar a ilha que busca e amor que ama. Nobre apenas de memórias, vai lembrando de seus dias, dias que são as
histórias, histórias que são porfias de passados e futuros, naufrágios e
outros apuros, descobertas e alegrias. Alegrias descobertas ou mesmo achadas, lá vão a todas as naus alertas de
vaia mastreação, mastros que apoiam caminhos a países de outros vinhos.
Está é a ébria embarcação. Barão ébrio, mas barão, de manchas condecorado; entre o mar, o céu e o
chão fala sem ser escutado a peixes, homens e aves, bocas e bicos, com
chaves, e ele sem chaves na mão. A ilha ninguém achou porque todos o sabíamos. Mesmo nos olhos havia uma clara geografia. Mesmo nesse fim de mar qualquer ilha se encontrava, mesmo sem mar e sem fim, mesmo sem terra e sem mim. Mesmo sem naus e sem rumos, mesmo sem vagas e areias, há sempre um copo de mar para um homem navegar. Nem achada e nem não vista nem descrita nem viagem, há aventuras de partidas porém nunca acontecidas. Chegados nunca chegamos eu e a ilha movediça. Móvel terra, céu incerto, mundo jamais descoberto. Indícios de canibais, sinais de céu e sargaços, aqui um mundo escondido geme num búzio perdido. Rosa-de-ventos na testa, maré rasa, aljofre, pérolas, domingos de pascoelas. E esse veleiro sem velas! Afinal: ilha de praias. Quereis outros achamentos além dessas ventanias
tão tristes, tão alegrias? (Trecho de Invenção de Orfeu, de Jorge de
Lima).
MAGNIFICO. VC ESCOLHEU A DEDO. ADOREI. DENISE CARNEIRO
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