Num
universo de aproximadamente 24 mil profissionais em atividade com inscrição
pela Ordem dos Advogados do Brasil, seção Ceará (OAB-CE), o dado é relevante: o
Ceará tem atualmente 611 advogados proibidos de atuar, suspensos
disciplinarmente por períodos que vão de 30 dias até um ano. Decisões tomadas
pelo Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OAB-CE. Acusações as mais
diversas, desde a inadimplência na entidade até tomar indevidamente para si o
dinheiro de causas em que atuou.
Vários
desses processos em análise podem passar por simples advertência, avançar para
suspensão ou resultar em expulsão da entidade e o impedimento definitivo da
profissão. Entre as situações mais graves analisadas, advogados estão suspensos
porque teriam se apropriado de valores de seus clientes ou por suposta
participação direta em atos de corrupção junto a agentes públicos. O POVO não
teve acesso à lista com os 611 nomes – para a maioria deles inclusive, a
divulgação estaria impedida por força de lei.
Dentre
os suspensos está José Afonso de Oliveira, de 75 anos. Afonso hoje é proibido
formalmente de qualquer atuação advocatícia. É acusado de não repassar dinheiro
de causas previdenciárias ganhas a pelo menos 30 de seus clientes. E corre
risco de ser expulso da Ordem. “A quantia que (Afonso) não repassou
ultrapassaria R$ 1 milhão, aproximadamente. Individualmente, é o caso mais
grave no Tribunal. Talvez seja o que tenha o maior valor de apropriação
indébita, somadas as várias ações”, aponta o presidente do Tribunal de Ética e
Disciplina, José Damasceno Sampaio.
No
site do Tribunal de Justiça do Ceará, o nome de José Afonso aparece pelo menos
20 vezes em processos como réu, indiciado, condenado ou já sendo cobrado a
devolver quantias que teria se apossado. A maioria dos seus clientes eram
aposentados do Interior cearense. Ao O POVO, por telefone, José Afonso de
Oliveira negou as acusações. Disse que segue sua defesa junto ao TED. Argumenta
que “não é bem apropriação indébita. É pagamento atrasado, é outra coisa” (leia
matéria abaixo). E garante que não pretende mais exercer a advocacia, está
aposentado, mas quer sustentar sua versão nos processos.
Outro
advogado suspenso também teve a acusação apurada tanto no Tribunal de Ética
quanto na raia policial. Também por apropriação indébita. Alexandre Augusto de
Oliveira Lopes, de 42 anos, está proibido de exercício da atividade por 90
dias, segundo decisão da última sessão do TED de 2016, em dezembro passado –
informa Damasceno. Um mês antes, no dia 24 de novembro, o advogado foi levado
coercitivamente para depor e seu apartamento passou por busca e apreensão.
Lopes
foi acusado de se apossar de parte de uma indenização de R$ 360 mil de
uma
cliente – ressarcida por um plano de saúde num caso de negligência médica,
depois de perder a filha de dois anos. A investigação contra Lopes foi feita no
2º Distrito Policial (bairro Aldeota). “O inquérito já foi concluído e
encaminhado à Justiça no início de dezembro”, confirmou o delegado Dionísio
Amaral, responsável pelo caso.
O
POVO enviou email para Alexandre Lopes na segunda-feira, dia 16/1 – reenviado
dia 23. Não houve retorno até o fechamento da reportagem. Na consulta ao
cadastro da OAB Nacional, pela internet, Alexandre ainda aparece em “situação
regular”.
CORRUPÇÃO ATIVA
Em
2016, pelo menos 22 advogados responderam a processo no Tribunal de Ética,
acusados de corrupção ativa. Foram apontados em investigações das operações
Expresso 150, Cappuccino e Cardume, todas da Polícia Federal. Os inquéritos
levantaram a suposta oferta de dinheiro para desembargadores e funcionários
públicos, em troca da soltura facilitada de seus clientes traficantes.
Seis
desses advogados acabaram inocentados nas apurações ética e disciplinar do TED.
Dos demais, três cumprem suspensão decidida em medida cautelar: Michel Coutinho
e Fernando Feitosa, ambos afastados da atividade por 12 meses, e Mauro Rios
(suspensão reduzida de 12 para nove meses) – citados na Expresso 150. Os três
são sujeitos a expulsão pelo Conselho de Ética. O caso ainda terá julgamento do
mérito, que, acredita Damasceno, “deve ser analisado até o fim deste semestre.
Mas a prova contra eles é induvidosa”.
Dos
demais advogados investigados nas operações e processados no TED, mais dois
foram suspensos e recorreram. Outros dois serão julgados na próxima sessão do
Tribunal, dia 1º/2, e os demais nove seguem com processo disciplinar em
trâmite. Os casos pendentes devem ir a julgamento no Tribunal até o fim deste
semestre. “Todos alegam inocência”, acrescenta Damasceno.
ENTENDA O PROCESSO DISCIPLINAR
1. O
Tribunal de Ética e Disciplina da OAB abre processos a partir de investigações
policiais ou notícias da imprensa. As denúncias podem ser feitas pessoalmente,
na sede ou nas subseções da OAB-CE, ou pelo email protocolo@oabce.org.br
2. O
trâmite é semelhante a um caso jurídico normal:coleta de provas,
depoimentos,diligências. Para suspensão ou expulsão, 2/3 dos 40 votos (27) do
Pleno do Conselho decidem a punição.
3.
Se punido, a carteira da OAB é retida e o nome entra no Cadastro Nacional de
Sanções Disciplinares da OAB nacional. Não pode ocupar função pública. As
infrações se graduam em advertência, suspensão (de um a 12 meses), expulsão e
multa (até dez vezes o valor da anuidade).
4.
Se o advogado recorre, há o efeito suspensivo – no caso de advertência ou
suspensão. O recurso para caso de expulsão é apresentado ao Pleno do TED. Há
recurso no Conselho Seccional da OAB-CE ou no Conselho Federal da OAB.
O Povo
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