Editorial
publicado pela Folha de S. Paulo nesta segunda-feira questiona, pela primeira
vez, a conduta de Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal, e aponta
que, com duas decisões recentes que blindaram o senador Aécio Neves (PSDB-MG),
ele dá vazão a teorias sobre a imparcialidade do Poder Judiciário no Brasil.
Recentemente,
Gilmar devolveu, sem tomar qualquer medida, dois pedidos de investigação contra
Aécio formulados por Rodrigo Janot, procurador-geral da República.
Há pouco mais de
duas semanas, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, tomou uma
decisão atípica. Solicitou que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
reavaliasse a necessidade de investigar o senador Aécio Neves (PSDB-MG),
supostamente envolvido num esquema de corrupção em Furnas.
Na semana passada,
Gilmar repetiu a atitude incomum. Devolveu a Janot um novo pedido de abertura
de inquérito sobre o tucano. Dessa vez o procurador-geral pretendia apurar
eventual participação do presidente do PSDB em alegada maquiagem de dados do
Banco Rural, que teria o intuito de ocultar o chamado mensalão mineiro.
Levantadas a
partir da delação premiada do senador cassado Delcídio do Amaral (ex-PT-MS), as
duas suspeitas sobre Aécio – que nega envolvimento nos casos – dependem de
maior averiguação para serem confirmadas ou descartadas. Apenas depois disso,
havendo indícios suficientes, uma ação penal poderá vir a ser instaurada.
É por isso mesmo
difícil entender as duas decisões de Gilmar Mendes. Ao criar obstáculos para o
Ministério Público Federal, o ministro do STF não permite nem que se inicie uma
tentativa de esclarecer os episódios narrados por Delcídio.
Como regra, os
juízes rejeitam a abertura de inquérito apenas em situações excepcionais – por
exemplo, quando o promotor ou procurador da República pede para apurar uma
conduta que, mesmo se comprovada, não constitui crime. Não é essa a situação de
Aécio.
Ainda que não
fosse pelo clima de exaltação na política, magistrados em geral deveriam evitar
medidas que subvertam a prática forense. Especialmente em tempos de Lava Jato,
comportamentos inusuais sempre darão ensejo à formulação de teorias
conspiratórias.
Por esse motivo o
presidente do STF, Ricardo Lewandowski, viu-se obrigado a frisar, por meio de
nota, que eventuais conversas de ministros com políticos não trazem prejuízo à
imparcialidade dos julgamentos. Moveu-se porque alguns, ele inclusive, foram
citados nos diálogos gravados por Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro.
Dias antes, Gilmar
Mendes dissera algo com o mesmo espírito – e, por enquanto, não há sinais de
que estejam errados nesse aspecto.
Mas, até para
afastar desconfianças em relação ao único Poder que ainda conta com algum
prestígio popular, os ministros deveriam observar com a máxima atenção a
cartilha do Judiciário. Isso vale especialmente para o ministro Gilmar, que
agora acumula a presidência do Tribunal Superior Eleitoral com a da segunda
turma do Supremo, responsável por julgar os processos da Lava Jato.
(brasil 247)
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